A lei que estabelece o casamento entre pessoas do mesmo sexo, desde 31 de Maio de 2010, é omissa no que concerne às uniões entre portugueses e cidadãos estrangeiros, originando que casais homossexuais estejam a ser impedidos de celebrarem tal contrato.
O Ministério da Justiça ainda não se pronunciou publicamente sobre este cenário, refira-se. Mas, em contrapartida, os casais homossexuais que tentaram aceder ao casamento junto de consulados ou embaixadas portuguesas no estrangeiro, desde que a lei está em vigor, já obtiveram uma resposta do Instituto dos Registos e Notariado (IRN): são homossexuais, um deles sem cidadania portuguesa e a lei é omissa. Logo, não há casamentos até haver uma clarificação legislativa.
Este foi o esclarecimento disponibilizado a João V., um português residente em Barcelona (Espanha), quando tentou casar-se com o companheiro – um cidadão brasileiro – na Conservatória do Registo Civil de Coimbra. Informação idêntica foi dada na conservatória da rua de Ceuta, no Porto, cuja funcionária admitiu ser o segundo caso que ali surgia.
Desde então, devido à insistência junto das entidades competentes, aguarda que o Conselho Técnico do IRN emita um parecer sobre a falha detectada, de modo a que este seja divulgado junto das conservatórias.
“A lei (do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo) é omissa quanto à possibilidade de celebração desta modalidade entre dois cidadãos estrangeiros e entre um cidadão português e um cidadão estrangeiro, quando a lei da nacionalidade daqueles não permite a celebração daqueles casamentos”, refere fonte do sector jurídico do IRN, salientando que nos termos do Código Civil, a questão em tabela é plurilocalizada, “colocando em confronto vários ordenamentos jurídicos, sendo por isso complexa e melindrosa”.
Segundo João V., com 32 anos e os últimos quatro a viver em Espanha, após a alteração legislativa em Portugal que permitiu o casamento gay, a primeira nega surgiu em Coimbra, mesmo depois de entregue toda a documentação exigida.
“A alegação da conservadora para negar o pedido baseava-se em que neste momento corria um pedido de parecer junto das entidades brasileiras para esclarecer a impossibilidade de um cidadão brasileiro não-residente em Portugal poder contrair matrimónio com um cidadão português, ao amparo da lei portuguesa”, conta, salientando que o companheiro conta com um visto de turista para o Espaço Schengen.
Porém, esta resposta contraria a postura do Consulado Português no Rio de Janeiro, que permitiu logos nos primeiros dias de aplicação da lei o casamento de uma sua funcionária – portuguesa – com uma cidadã brasileira. “Não é isto uma forma de discriminação? Um casamento entre pessoas de sexo diferente é permitido nestas condições e um casamento entre pessoas do mesmo sexo é negado?, questiona João V.
Se o visto de turista poderia ser um entrave, é o próprio Serviço de Estrangeiros e Fronteiras a esclarecer as dúvidas: um visto de entrada temporário com título de entrada turística ou visto de Schengen permitem a celebração do casamento (de um cidadão estrangeiro com um português).
O JN sabe que o Conselho Técnico do IRN está a analisar, com carácter de urgência tanto esta questão, como o reconhecimento em Portugal dos casamentos celebrados no estrangeiro, de modo a produzir um parecer que possa ser divulgado nas conservatórias.
Nuno Miguel Ropio, in
Jornal de Notícias