17 de janeiro de 2010

À Beleza

Não tens corpo, nem pátria, nem família,
Nem te curvas ao jugo dos tiranos.
Não tens preço na terra dos humanos,
Nem o tempo te rói.
És a essência dos anos,
O que vem e o que foi.

És a carne dos deuses,
O sorriso das pedras,
E a candura do instinto.
És aquele alimento
De quem, farto de pão, anda faminto.

És a graça da vida em toda a parte,
Ou em arte,
Ou em simples verdade.
És o cravo vermelho,
Ou a moça no espelho,
Que depois de te ver se persuade.

És um verso perfeito
Que traz consigo a força do que diz.
És o jeito
Que tem, antes de mestre, o aprendiz.

És a beleza, enfim! És o teu nome!
Um milagre, uma luz, uma harmonia,
Uma linha sem traço…
Mas sem corpo, sem pátria e sem família,
Tudo repousa em paz no teu regaço!

(Miguel Torga)

3 comentários:

TheMenBehindTheCurtain disse...

Simplesmente soberbo.

Nunca li nada mais a sério do Torga, mas sempre que apanho excertos dele, é completamente embriagante a torrente de imagens e emoções que a poesia dele oferece.

Abraços

paulo disse...

bolas, já se foi há 15 anos... homem da terra e de terra que também sou, lembro-me de ter chorado. mas é assim a vida e a poesia

João Roque disse...

Tantas vezes esquecido, nunca demais lembrado, o poeta e não só, mais genuinamente português que já tivemos.